Sei que é feio ouvir a conversa das outras pessoas, mas quando estamos numa fila, num espaço pequeno, mesmo não querendo acabamos por ouvir algo que não nos diz respeito. O problema centrou-se no exato momento em que oiço dizer "ah, a professora do meu também propôs isso, mas matriculamo-lo na mesma no 1.º ano".
Defeito de profissão, chamemos-lhe isso, fiquei com o radar sintonizado. Feio, admito, mas curiosa.
Resumidamente, a conversa entre dois pais centrava-se na temática de inscrever ou não os filhos no 1.º ano com 5 anos. Pelos vistos as Educadoras de ambas as crianças propuseram aos pais a frequência de mais um ano no Jardim de Infância de forma a entrarem no 1.º ano com 6 anos, a caminho dos 7.
Enquanto um dos pais aceitou a proposta da Educadora de Infância e deixou o filho mais um ano no Jardim de Infância, alegando que considerava que agora o filho tinha maturidade para fazer uma boa aprendizagem, o outro pai manifestava opinião contrária, dizendo que o filho iria entrar com 5 anos porque estava curioso para aprender, apesar de só fazer os 6 anos em novembro. "Dificuldades? Estaremos lá para apoiar."
Este assunto é debatido todos os anos com os Encarregados de Educação, Educadoras de Infância e Professores do 1.º ciclo. Qual a melhor decisão: permanecer mais um ano no Jardim de Infância, brincando e ganhando maturidade ou matricular a criança no 1.º ano, uma vez que entre um a dois meses fará os 6 anos?
Muitos Encarregados de Educação, pais, avós, ... consideram que o facto de a criança entrar para o 1.º no com seis anos a fazer os sete entre outubro, novembro ou até dezembro, esta está a perder um ano de escola. Muitos Educadores e Professores consideram que é exatamente este ano que fará a diferença em sala de aula e na predisposição para aprender, sem questionar o número de horas que vai passar a estar sentado com uma ficha de trabalho à frente.
Os programas são extensos, o grau de exigência e cumprimento dos mesmos faz com que o professor tenha que "impor" um ritmo de trabalho em que muitas das vezes a criança de 5 a fazer 6, a trabalhar ao lado do colega de 6 que faz 7 em janeiro, não é de todo compatível. Procuramos criar autonomia nas crianças, mas um ano de diferença, nestas idades e nesta fase de aprendizagem, faz muita diferença.
É óbvio que há crianças que entram na escola com 5 anos (eu fui uma dessas crianças) e que fazem as aprendizagens tal como as outras crianças, e por vezes até alcançam excelentes resultados académicos.
A minha questão, e daí este meu pensamento, é apenas uma: na sociedade atual em que o tempo para brincar é pouco, tal é o elevado número de atividades que as crianças têm de frequentar face à incompatibilidade de horários de muitos pais, qual a pressa em retirar a possibilidade da criança continuar a ser criança?
É claro que as crianças aprendem, é claro que os pais estarão presentes para apoiar... mas este apoio é "uma faca de dois gumes", pois a criança habitua-se à presença de um dos pais sempre que realiza tarefas escolares e dificilmente fará as mesmas sozinha, mesmo não tendo dúvidas.
Por outro lado, pergunto: numa sociedade em que nos queixamos da imaturidade presente nas crianças em idade "desfasada" da mesma, por que não as deixamos crescer calmamente e alcançar a maturidade necessária?