quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Pequeno concerto

Este tem sido um ano letivo com muitas mudanças e novidades.
Pela primeira vez estou a trabalhar com alunos que frequentam uma unidade de multidificiência. Tal como o nome indica, as deficiências são várias.
O desafio é enorme!
Os alunos são do melhor que há: simpáticos, bem dispostos, participativos, cooperantes (os que têm menos dificuldades ajudam os outros), tolerantes, .... e uma infinidade de adjetivos qualificativos.
Mas que tipo de trabalho posso desenvolver com um grupo de 9 alunos, todos tão diferentes, mas no fundo muito iguais? Desejosos de trabalhar, saber mais, ouvir, participar, brincar, rir,...
Entre as várias atividades que tenho desenvolvido com eles, desde exercícios de relaxamento, à exploração espontânea de intrumentos Orff, ao acompanhamento de diferentes músicas, à execução de pequenos ritmos, depressa me apercebo que este pequeno grupo, que no fundo é enorme, fica feliz com muito pouco.
É aí que eu tropeço. Apesar da felicidade deles, da sua demontração de amizade e carinho, saio daquelas aulas sempre com uma sensação de vazio, uma sensação de impotência, de querer fazer mais, de querer chegar a todos em igual modo e não ser possível.
Esta semana foi diferente. Aliás, já começou na semana passada.
Na semana passada decidi levar o saxofone soprano e tocar algumas melodias para eles. Entre as tentativas para descobrir o nome do instrumento, o fascínio da sua cor dourada, o ouvir e identificar as músicas conhecidas, a alegria foi mais que muita. Para ajudar, ainda pediram algumas musicas conhecidas, os famosos "Parabéns" que foram cantadas e tocados, re-cantados e re-tocados e voltados a cantar e tocar para todos, "o balão do João" e "O teu corpo é música". Esta última foi uma canção trabalhada com os alunos do 1.º ciclo e uma das aulas desta sala também frequenta as AEC. A felicidade que foi a professora tocar, a aluna cantar para o restante grupo. Depois voltaram a pedir a mesma canção e todos tentaram colaborar fazendo os respetivos sons corporais que a música pedia (bater as mãos, os pés, nas pernas e estalar os dedos).
Perante os sorrisos grandiosos deste pequeno público fascinante, percebi que, nesse mesmo dia, lhes tinha dado muito!
Entretanto fui desafiada pelo professor da Educação Especial que os acompanha, a realizar um pequeno concerto de Natal para este grupo, na aula seguinte, ou seja, esta semana (hoje).
Lá selecionei vários temas de Natal, uns mais conhecidos, outros nem tanto, e apresentei-os ao grande público.
As músicas que conheceram fizeram questão de as cantar enquanto eu tocava e três dos alunos, que trabalham comigo nas respetivas turmas (4.º e 5.º anos) decidiram levar a flauta de bisel e acompanhar a professora, imitando o ritmo da música, apesar de executarem uma nota só. Outro dos alunos decidiu ser o maestro, com direito a batuta e tudo. E muito exigente, pois só ao seu sinal é que podiamos começar a tocar.
Entretanto, à janela da sala aparecem os alunos do 4.º ano que entravam mais tarde e que foram convidados a assistir um pouco ao concerto. Fascinados, entraram na sala da unidade de multidificiência, instalaram-se no meio dos alunos que lá estavam, sentaram-se no chão e fizeram silêncio como se fossem gente crescida.
Pediram para tocar, lá toquei alguns temas que conheciam, toquei a canção de Natal que temos andado a ensaiar (À volta do pinheiro) e eles fizeram questão de cantar para os alunos daquela unidade.
Entretanto pediram-me para tocar também a música "O teu corpo é música" para cantarem para os meninos da unidade. E aí sim, o verdadeiro espetáculo verificou-se. Todos cantaram e decidiram ajudar os colegas da unidade a participar, ajudando-os a fazer os gestos.
É nestes pequenos momentos, ainda que improvisados, que sinto que o papel de um professor vai muito para além do ensinar a "papaguear". Sem necessidade de pedir o que quer que fosse, nem silêncio, aquela turma de 21 alunos entra num espaço que não é deles, sentam-se onde dá mais jeito, cantam e ajudam um grupo de alunos diferentes deles, mas iguais, a acompanhá-los neste pequeno concerto. Foi um momento mágico!
Quando chegou a hora de irem para a sua sala, despediram-se de todos eles com abraços e beijinhos, sem que fosse preciso dizer-lhes algo.
E lá continuei o meu concerto, agora com os alunos das flautas encostados a mim e a folhearem os livros que eu tinha levado e, mesmo sem saberem ler, a pedirem para tocar esta e aquela música. Acompanharam-me sempre.
Foi tão gratificante ver os sorrisos deles, a alegria, as reações espontâneas em bater as palmas a acompanhar a música, a capacidade inata de marcar a pulsação da música com palmas, que, numa semana fria, cansativa, trabalhosa, doentia, o meu coração aqueceu e cresceu. Naquele momento senti que não há nada que possamos ter que nos dê uma sensação tão fantástica e calorosa, como ver a felicidade nos rosto daquelas crianças fantásticas.
Para acabar em grande, recebi um enorme e caloroso abraço de turma.
Não há nada que descreva o sentimento que me encheu naquele momento.



quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Causa nobre

Mais uma quarta-feira, mais uma caminhada.
Nem o vento, nem o medo da chuva me fizeram desistir desta caminhada. Nem tão pouco a garganta que ainda não sabe se deve doer sempre ou só de vez em quando, nem os sintomas febris que volta e meia aparecem. Hoje nada me parava!
Quando a causa é nobre, e neste caso mais que nobre, nada nem ninguém nos impede de seguir em frente.
Pouco antes das 21h30 lá cheguei à Praça da Fruta e lá encontrei a pessoa desta causa: o Marco.
O Marco é um aluno que conheci este ano, que faz parte da sala de multidificiência e que necessita de uma cadeira de rodas adequada ao seu tamanho e necessidades, para se deslocar. É um adolescente simpático e bem disposto e que nos faz pensar na importância (por vezes demasiada) que damos aos nossos contratempos.
Hoje a caminhada era por ele! Foi gratificante ver como as pessoas aderem às causas nobres. Foi gratificante ver como aquela família de 8 pessoas manifesta carinho e amor por todos. Foi gratificante ver como os professores, perante tanta dor de cabeça, ainda têm coragem para abraçar esta nobre causa e com um sorriso no rosto abdicam de uma noite no conforto do lar para ajudar o Marco.
Verdade seja dita, o Marco consegue tocar-nos. A sua alegria, o seu sorriso e simpatia deixam o "Gru, o maldisposto" totalmente bem disposto.


segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Mais uma segunda-feira

A letra da canção diz "é sexta-feira yeh", eu fico-me mesmo por "segunda-feira, oh não!".
Mais uma segunda-feira, gelada, esbranquiçada e ainda por cima constipada.
Começo o dia a pensar de devo ou não sair da cama... resultado, não devia mesmo ter saído da cama, ponto!
O frio que se fazia sentir fora dos lençóis chegava aos ossos e congelava-os, mas eu, cheia de coragem, lá decidi enfrentá-lo. Despir o pijama foi uma carga de.. frio! E um novo pensamento me salta: não devias ter saído da cama. (Vá se lá saber porquê! Drama de segunda-feira, definitivamente.)
Lá me despacho, olho para o relógio e penso: "bolas, deve ser do frio, despachei-me muito depressa."
Saio de casa e paro no café da esquina para uma bica matinal, pois é preciso energia, é que acordar eu acordei, graças ao calor estranho que se fazia sentir.
Lá me ponho a caminho da escola, a conduzir de casaco vestido, que é uma coisa que dá imenso jeito, e a rogar pragas ao frio... Novo pensamento: "é pá, não protestes que já ameaçam chuva para o final da semana e dessa, tu ainda gostas menos." (Espírito protestante sempre em força, se faz frio é porque faz frio, se chove é porque chove, mas se está calor... não apetece fazer nada.)
Começo a descer o vale em direção à aldeia onde fica a escola e reparo, mais uma vez, que alguém andou a espalhar farinha pelos campos... ups e na estrada também. Foi uma viagem e peras, para não dizer pior... Outra curva e a estrada branca, pensamento instantaneo: "se isto continua ainda tens de comprar correntes para andar no gelo!" Fantástico ainda ontem alguém me dizia que o frio nas Caldas era muito melhor de suportar do que em Leiria. Piadas! Em Leiria nunca apanhei gelo na estrada.
Lá continuo a viagem para a escola, com a estrada branca, os campos brancos e eu... também! É que volta e meia a traseira do carro lá dava de si e deslizava, no gelo, que era um mimo. Pronto lá deixava eu o acelarador e o travão em descanso e esperava que o carro parasse quando lhe apetecesse. Sorte que não vinha ninguém de frente. Pudera! Com o calor estranho que se fazia sentir, sair de casa e ver tudo branco, os inteligentes voltam para a cama... os necessitados, como eu, têm  mesmo que ir trabalhar.
E qual era o pensamento que batia na minha cabeça? "Não devias ter saído do vale dos lençóis!"
Chego à escola e dou graças a Deus por o meu carro estar a chegar à adolescência e não ter termómetro, assim que oiço os colegas a falar: "Pois isto hoje é uma desgraça, pelo caminho apanhei -4; -3; aqui está -1,5." É que se o meu carro tivesse termómetro eu tinha dado meia volta e regressado a casa, assim não, lá fui trabalhar, numa sala congelada, onde nem tive coragem de despir o casaco nem de mandar os miúdos tirarem os gorros. Que me mandem prender!
À hora do almoço começa a doer-me o corpo, uma sensação estranha no pescoço, braços, pernas...até parecia que tinha dado uma valente queda por causa do gelo. E frio? Ainda mais! Dei-lhe com um comprimido, daqueles que o médico me disse que qualquer dia ganho uma ulcera no estômago porque são demasiado fortes e eu respondi-lhe que era o único que fazia efeito e até à data o estômago não se tinha queixado. (Espero que assim continue que isto já não vai com pastilhas fracas).
E lá fui dar mais duas horinhas de aulas! O que vale é que os miúdos estavam em dia sim e foi uma beleza.
A caminho de casa, demorei mais que o costume, pois nestes dias tudo de mau acontece: primeiro jipe da GNR à frente (lá tive que cumprir o famoso limite de 50), depois camião carregado de lenha e o percurso era a subir. Vais em segunda que não dá mais.
Chego às Caldas, olho para o telemovel , mensagem daquelas que nos abanam e nova sensação que não devia ter saído da cama. Então lembro-me do outro: há dias de manhã que um homem à tarde, não devia sair à noite!
E verdade seja dita, se isto não melhora... cheira-me a choco no final das aulas e nas férias!
O que me passa pela cabeça? Só me apetece gritar!!!!!! (Mas acho que os vizinhos não iam gostar, logo terei que pensar noutra estratégia.)